Casa centenária resgata técnicas tradicionais com modernidade, e produz alguns dos vinhos mais reconhecidos do mundo
Quando estamos na seção de vinhos, facilmente a dúvida bate na cabeça: qual a melhor opção na faixa de preço que eu busco? Uma das melhores opções é procurar pelos portugueses, que raramente nos deixam na mão até mesmo nas faixas de preço mais baixas. Quando temos um nome de fama internacional, então, a escolha é praticamente certa, e os vinhos de José Maria da Fonseca são a tradução perfeita dessa situação.
Com estilo moldado na busca pela excelência no Alentejo, a vinícola José Maria da Fonseca é, como tantas outras, uma companhia familiar, cuja fundação em 1834 foi um ato de visão que resultou num verdadeiro império vinícola. Na época, a pequena cidade alentejana de Azeitão tinha pouca projeção no panorama vinícola português, e hoje já na sétima geração a empresa é uma das maiores produtoras, com um nível de exportação de 80% e que foi selecionada como uma das 100 Top Wineries pela "Wine & Spirits Magazine", uma das principais publicações do setor.
Se ainda resta dúvida da relevância da casa José Maria da Fonseca, basta dizer que são eles os produtores do Periquita, um dos rótulos mais famosos de vinho do mundo - e um dos que mais agradam desde bebedores mais novos até os mais experientes enófilos. Seu nome, que é sinônimo da Castelão, casta mais comum de Portugal, tem uma constância invejável para qualquer vinho do mundo, e incorpora a história de praticamente qualquer pessoa que gosta de vinho português.
Uma das maiores características da José Maria da Fonseca é o pioneirismo, muitas vezes aliado a um resgate de tradições que nos mostra o potencial de técnicas quase esquecidas. Um exemplo é a utilização parcial de ânforas na vinificação do José de Sousa Mayor, uma técnica centenária que foi incorporada em 1986, quando a vinícola adquiriu uma produtora menor no Alentejo, mas que utiliza a uva Grand Noir, uva tintureira (de polpa colorida) que é a cruza de duas outras variedades feitas em 1855 por Henri Bouschet na França. Outro vinho que resgata uma tradição local é o Ripanço, que leva o nome da técnica romana de "esfregar" o vinho em tábuas, ou ripas, para fazer o desengace e extrair o máximo da uva, resultando numa bebida mais aveludada e intensa.
As publicações especializadas ressaltam as qualidades dos vinhos de José Maria da Fonseca, principalmente os Moscatéis da região de Setúbal. Hugh Johnson concede um máximo de três estrelas à vinícola, com destaque aos fantásticos Roxo e Alambre 20 anos, e Oz Clarke ainda chama de "soberbos" alguns dos mais antigos - e raros - Moscatéis da casa. Em degustação guiada por António Soares Franco, administrador da vinícola, as características olfativas únicas dessa variedade foram lembradas numa curiosidade histórica: durante as invasões napoleônicas, as mulheres da corte russa, ao se verem privadas dos perfumes franceses, se banhavam em Moscatéis de Setúbal para incorporar seus deliciosos tons olfativos.
O aproveitamento da história da região aliado ao pioneirismo visionário da José Maria da Fonseca explica seu sucesso, já que é uma vinícola que conhece sua região como poucos, e o resultado é uma gama de vinhos de sucesso que oferecem sempre o melhor para quem procura qualidade. Realmente, uma vinícola com rótulos para tomar sem medo!
Notas de Degustação
Periquita Branco
Feito a partir das aromáticas Verdelho e Sauvignon Blanc, da estruturada Viognier e da refrescante Viosinho, este branco de cor amarelo claro ligeiramente esverdeado traz uma mistura de aromas de frutas tropicais amarelas (maracujá), grama cortada e notas de manjericão. Sem passagem por madeira, é um vinho bem seco em boca, que também se mostra muito fresco e mineral, com boa persistência e um final limpo. Ótimo vinho para o calor, como aperitivo ou com frutos do mar.
BSE
O "Branco Sempre Especial" é um dos favoritos para acompanhar peixes e frutos do mar em Portugal. Leva Antão Vaz (que dá estrutura) e Arinto (para a acidez). A coloração é amarelo palha, quase dourado, e o nariz traz aromas cítricos e de frutas brancas. A boca traz muito frescor, também totalmente seca e mineral, mas aqui mais delicada e com um final mais frutado. Deve render maravilhosas harmonizações!
Albis
Neste vinho, que leva Arinto e Moscatel de Alexandria, a coloração é um amarelo mais dourado e vivo, e os aromas trazem notas de melão maduro com frutas tropicais (abacaxi, manga) e florais, com um fundo de mel muito discreto. A boca é muito envolvente, com as sensações de acidez trazendo frescor acompanhada de uma ligeira untuosidade. Um branco sedutor.
Periquita Rosé
Um rosé de belíssima coloração rosa-pálido, com a nota puxando à casca de cebola, traz deliciosos aromas de groselhas com casca de limão siciliano. A boca traz frescor na acidez gastronômica, persistência média, sensação frutada mas sem açúcar residual notado. Um rosé delicioso e fresco para acompanhar peixes gordurosos ou sushi sem medo!
Periquita Tinto
O "vinho sem surpresas" que, por muitos, é a segurança de ter sempre um vinho agradável, traz uma consistência invejável entre as safras. O nariz de frutas vermelhas bem intensas e ligeira nuance de anis (passa apenas por madeira usada para oxigenação). A boca tem taninos discretos e muito frescor, característico da Castelões, que coloca a fruta sempre em primeiro lugar.
Ripanço
São quatro variedades neste corte: Aragonês, Trincadeira, Syrah e Alicante Bouschet. O método de produção em ripanço, hoje pouco usual, busca extrair o máximo da uva. Por isso, tanto o nariz quanto a boca são intensos na fruta vermelha e negra (amora, cereja), com taninos bem redondos e uma sensação de açúcar perceptível, o que torna esse um vinho bastante amigável aos novos bebedores. Mais que uma curiosidade, esse vinho é uma preciosidade da casa.
Periquita Reserva
Aqui, as melhores amostras de Castelão vai complementada da Touriga Nacional e de Touriga Franca, para adicionar complexidade aromática e estrutura, e com a maior passagem em madeira temos os aromas de tostado e baunilha. A boca é bastante aveludada e tem uma nota de açúcar mais perceptível, mas discreta, com a acidez ainda bem marcada e um final muito agradável. Um vinho distinto e bastante adaptável, acompanha uma gama muito grande de pratos - mas também é um ótimo aperitivo.
José de Sousa Mayor
Talvez o vinho mais distinto deste painel, é feito 50% em ânforas adquiridas em 1986, e com uma uva tintureira única, a Grand Noir, prima da Alicante Bouschet, mas que remete às origens da região. Com nariz que remete a couro e tabaco com cerejas negras, notas aromáticas pouco típicas de vinhos alentejanos. A boca é muito sedutora, aveludada, com frescor e persistência alta, e um final muito suculento. Grande potencial de guarda para este grande exemplar.
Certificado como vinho vegano.
J 2015
Nascido de uma descrição que levou à definição do modo de produção do vinho (o que é o oposto de como normalmente um vinho é feito), é um exemplar de grande elegância. Feito também com a Grand Noir em corte com Aragonez, Trincadeira, Touriga Nacional e Touriga Franca, tem um nariz complexo, com muitas frutas frescas e maduras temperado com um fundo de couro. Em bica, o alto teor alcoólico traz uma maciez que acompanha os taninos marcantes. Novamente um Alentejano sedutor.
Moscatel Roxo
Este é provavelmente o vinho fortificado com aguardente vínica mais típico do sul de Portugal. Envelhecido em madeira usada, leva a uva chamada Moscatel Roxo, uma mutação da Moscatel que adquiriu a coloração intermediária entre branca e tinta. É uma uva de baixo rendimento, pois é uma das favoritas dos pássaros. A coloração da uva se traduz num vinho de tonalidade caramelo avermelhado, brilhante, que lembra um mel bem intenso. O nariz traz notas de figos secos, um pouco de tabaco, mel e compota de laranja. A boca traz um grau de doçura equilibrado, com acidez também perceptível, persistência muito prolongada e um final delicioso. Um vinho com potencial de guarda sem igual, que facilmente ultrapassa os 50 anos ainda intacto!
Alambre 20 Anos
Além de todas as deliciosas características da uva, este delicioso fortificado traz sensações olfativas únicas, com notas resinosas refrescantes que lembram pinho cortado, flor de laranjeira. Em boca, a acidez e o açúcar em evidência persistem no paladar por muito tempo. Um vinho "para beber de joelhos", como bem descreveu Carlos Cabral.
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