Harmonização é ideal para refrescar a intensidade dos queijos europeus
Com receitas inspiradas nas champanhes francesas, os espumantes brasileiros são bebidas leves e frescas conhecidas por acompanhar queijos intensos. Eles provocam uma sensação de contraste que refresca o paladar quando degustados com os queijos europeus, principalmente em países quentes como o Brasil.
Com isso em mente, o CNIEL (Centro Nacional Interprofissional da Economia Leiteira) e a União Europeia, através da campanha “Abra Seu Paladar”, chamaram a jornalista e mestre queijeira Débora Pereira para compor uma harmonização entre eles. Membro da Guilde Internationale des Fromagers, Débora vive entre o Brasil e a França: é diretora da ONG SerTãoBras, que trabalha pela valorização do queijo artesanal, tem pós-doutorado em Ciência da Informação pelo MediaLab Paris e escreve para a revista francesa Profession Formager e em seu blog Só Queijo. “As alianças propostas mostram a flexibilidade dos espumantes brasileiros. Eles estão à altura de acompanhar queijos franceses e europeus, seja em ocasiões informais como um almoço entre amigos ou nos momentos mais especiais de nossas vidas, como um pedido de casamento ou uma formatura”, afirma Débora.
Queijos de massa mole e casca de mofo branco (ou florida) (Brie, Brillat-Savarin, Camembert, Chaource, Coulommiers, Neufchâtel, Saint-Marcellin) + espumante rosé
A textura cremosa desses queijos vai derreter no paladar e em seguida será sublimada pelas notas de aromas de frutas vermelhas, como framboesa, morango e até de goiaba encontrados nos espumantes brasileiros feitos de uvas Chardonnay e Pinot Noir. “Para potencializar a intensidade dessa degustação, podemos deixar para servir no final o queijo Brillat-Savarin, o mais rico em creme entre os queijos franceses de casca florida. Um pecado para se viver à dois!”, sugere Débora. Queijo de indicação de origem protegida desde fevereiro de 2017, da região da Bourgogne, o Brillat-Savarin é famoso por seus aromas de creme e manteiga, um queijo festivo por excelência. “Ao longo da cura, as notas se intensificam e a textura se torna ainda mais cremosa, podendo a casca se descolar, ampliando as sensações na boca. A cremosidades do queijo é suavizada pelo frescor do espumante, simplesmente perfeito”.
Uma boa sugestão é harmonizar com o Coulommiers, que pelo seu tamanho é ideal para ser degustado em família. “De massa mais firme e casca muito branca, podemos decorar fatias de Coulommiers com geleia de jabuticaba. O agridoce da mais brasileira das frutas se associa aos outros aromas de frutas vermelhas do rosé e dá um toque de elegância visual ao queijo” recomenda a mestre queijeira. Uma opção mais descontraída é levar ao forno fatias de pão cobertas com fatias de Coulommiers - sua textura cremosa é ideal para receitas quentes. “No momento de servir, enfeite com um pingo de mostarda Dijon sobre cada fatia. A acidez da mostarda complementa o sabor do queijo e colore a ocasião!” afirma.
Queijos de massa prensada cozida (tais como os franceses Beaufort e Comté, o francês e suíço Emmental, o suíço Gruyère e o Maasdam holandês) + espumante seco
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Queijos de massa prensada não-cozida (tais como os franceses Mimolette, Saint-Paulin, Reblochon, Morbier e Abondance, os holandeses Gouda e Edam, e o Manchego espanhol) + espumante demi sec
Para começar bem uma refeição, o melhor é excitar as papilas com queijos de massa prensada que guardam umidade e maciez, como o Emmental. “Ele é o gigante dos queijos europeus e pode pesar entre 75 e 120 kg. Sua receita tem origem no século XIII e surgiu como uma maneira inteligente de conservar o leite: até 1.200 litros de leite em uma só forma!”, explica Débora. Com cerca de 27 cm de altura e até um metro de diâmetro, “seu gosto tem notas adocicadas devido a fermentação das bactérias propiônicas, elas produzem gás carbônico e incham o queijo, provocando as olhaduras na massa, traço típico da sua personalidade”. Outro queijo europeu para a hora dos aperitivos é o Saint-Paulin, que tem uma casca bem lisa de cor laranja, macia e elástica, de cores que vão do creme ao amarelo claro. Ambos, Emmental e Saint-Paulin, harmonizam muito bem com um espumante seco, com seus aromas de flores e tonalidade brilhante que vão do palha ao esverdeado, tom sobre tom com as cores dos queijos.
Se o desejo for servir o espumante com os queijos ao final da refeição, prefira queijos como o Comté ou Mimolette, de massas duras mais intensas. E escolha um espumante bem seco, extra bruto, mais elegante e com o mínimo de açúcar possível, de cor clara e sabor levemente floral. Que seja intenso e não seja agressivo. “Um Comté envelhecido a partir de 18 meses, com cristais de tirosina, ativa as papilas gustativas de forma mais intensa, o que se faz realmente necessário depois da refeição”, afirma Débora. Ele é o mais vendido e mais tradicional queijo de denominação de origem controlada da França, fabricado nas montanhas alpinas das fronteiras com a Suíça. “Sua textura é macia e sua cor pode variar de acordo com as estações do ano, sendo um amarelo mais brilhante e forte no verão, quando as vacas estão soltas e comem ervas e flores frescas, e um amarelo mais pálido no inverno. Isso naturalmente, pois na fabricação não é permitida adição de corantes”.
Já o queijo Mimolette tem cor alaranjada causada pela adição de urucum natural. De origem do norte da França, é conhecido por harmonizar com cervejas, portanto, também vai muito bem com as bolhas de um espumante demi sec. “Bem heterogêneo, pode ter uma casca fina e lisa ou, em uma versão mais rústica, ter casca curada com ácaros e bem irregular. A maturação pode se prolongar até dois anos, quando os sabores são mais intensos e a textura quebradiça, com cristais crocantes de tirosina” explica.
Queijos de massa mole e casca lavada (tais como os franceses Pont l’Évêque, Livarot, Époisses, Munster, o suíço Vacherin Mont d’Or, o italiano Tallegio e os alemães Limburger e Romadur) + espumante demi sec
Queijos como o Pont l'Évêque têm uma paleta ampla de aromas e sabores. A cor da sua casca é um bom índice da sua intensidade: mais branca, significa que o interior tem gosto de champignon, de leite fresco e frutas secas. Se a casca for mais alaranjada ou rosada, o queijo será mais cremoso e de sabores vegetais bem mais intensos. Uma questão de gosto! Esse queijo, natural das planícies normandas conhecidas pela abundância de macieiras, se harmoniza muito bem com uma champanhe demi sec, ou ainda com uma cidra, bebida gasosa feita a partir da fermentação de maçãs.
Queijos azuis (Bleu d’Auvergne, Bleu de Causses, Fourme d’Ambert e Roquefort da França, o Gorgonzola italiano ou o Stilton inglês) + espumante doces
“Para harmonizar queijos azuis como o Roquefort com espumantes, alguns especialistas aconselham tomar muito cuidado, porque a delicadeza das bolhas entra em conflito com intensidade do mofo azul”, alerta Débora. Original da região dos Causses, maciços calcários e áridos ao sul do maciço central da França, esse queijo de denominação de origem protegida é de uma generosidade incrível. Fabricado com leite de ovelha, as tonalidades azuis no interior da massa são resultado do trabalho do Penicillium roqueforti que se contrastam com a massa branca marfim. O período mínimo de cura é de 14 dias, mas os fabricantes preferem deixar os queijos curando pelo menos três semanas nas cavernas naturais da cidade de Roquefort-sur-Soulzon. Elas são ventiladas naturalmente por entradas de ar batizadas de florinas, que mantém uma temperatura muito estável de 9°C durante todo o ano.
“A solução para harmonizar um espumante brasileiro com queijos azuis é escolher um espumante mais doce, equilibrado entre doçura e acidez, com aromas de mel e florais de uvas como os feitos a partir de uvas Moscato Bianco e a Giallo”, indica Débora. “O queijo pode ser servido esparramado em fatias finas de pão integral tostado, rusticidade que dará o toque informal para um aperitivo entre amigos. Se quiser provocar sensações divertidas no paladar dos amigos, polvilhe em cada fatia uma discreta camada de açúcar explosivo. Genial!”
Os queijos devem ser retirados da geladeira meia hora antes de serem servidos, para que exalem o seu máximo de sabores e aromas, e para que a textura esteja mais cremosa. “A temperatura das bebidas também é muito importante, e deve ser entre 10 e 12°C. As taças não devem ser muito abertas e nem do estilo flautas muito fechadas, pois os aromas precisam de espaço para se propagar”, finaliza.
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